A reincidência, repetidamente constatada, é que tem conduzido a Corte a rejeitar contas do prefeito João Henrique, na medida em que ela traduz ineficiência, ineficácia e desleixo na administração dos recursos públicos e no cumprimento da Lei.
Na
sessão desta quinta-feira (13/12), o Tribunal de Contas dos
Municípios votou pela rejeição das contas da
Prefeitura de Salvador, na administração de João
Henrique de Barradas Carneiro, relativas ao exercício de 2011.
O
voto condutor da decisão, acolhido, na íntegra, por
todos os demais componentes do plenário, foi emitido pelo
Conselheiro José Alfredo Rocha Dias, primeiro técnico a
ter assento no Plenário do TCM, foi Auditor, e que faz questão
de manter a respectiva postura, infenso a influências de
natureza política, o que é reconhecido dentro e fora da
Corte.
Este é o terceiro
ano consecutivo em que as contas do prefeito João Henrique são
rejeitadas. As de 2009 e 2010 também o foram, tendo como
relatores, respectivamente, os Conselheiros Plínio Carneiro
Filho e Raimundo Moreira.
Além da rejeição,
a relatoria imputou multa ao gestor, no valor máximo de R$
36.069,00, determinando o encaminhamento de representação
ao douto Ministério Público Estadual para adoção
das providências que aquela Procuradoria entenda aplicáveis,
no âmbito de suas elevadas competências.
O município de
Salvador arrecadou no exercício financeiro de 2011 receitas no
montante de R$ 3.609.076.397,40. A tributária, que representa
os tributos de competência municipal, a exemplo do IPTU,
restringiu-se ao montante de R$ 1.296.572.941,54, equivalendo ao
percentual de apenas 35 % da total. O TCM vem recomendando, não
apenas a Salvador, mas a todos os municípios, a adoção
de firmes providências objetivando a elevação
desse percentual, de sorte a evitar que a Comuna continue na
dependência de recursos de outras esferas, como acontece na
Capital baiana, que não logrou incrementar as receitas
próprias.
A
administração municipal, pelo terceiro ano consecutivo,
não cumpriu o disposto no artigo 212, da Constituição
Federal, que regulamenta a aplicação de recursos na
área da Educação. Foi constatado o investimento
na manutenção e desenvolvimento do ensino no percentual
de apenas 21,59% da receita resultante de impostos, compreendida a
proveniente de transferências, conforme a legislação
e a regulamentação do TCM, reiterado inúmeras
vezes, inferior, portanto, ao limite mínimo de 25%, apesar dos
renovados exames efetivados pela área técnica da Corte,
inclusive em ampla documentação apresentada após
o sorteio das contas. Destaca-se que em 2009 o montante aplicado
alcançou R$
434.649.584,21, equivalente a 23,60%, e no ano seguinte o índice
atingiu somente 20,94%
da
receita resultante de impostos específicos, na quantia total
de R$
438.400.918,80.
O
gestor foi reincidente na efetivação de admissões
de pessoal sem a realização de prévio concurso
público, na forma exigida na Carta Federal, através de
terceirização e de contratação de
temporários, em substituição a servidores do
quadro. O Tribunal detectou, no tocante a despesas com pessoal
contratado temporariamente, em 2007, gastos de R$ 13.005.793,00. Em
2011 esse montante ascendeu para R$ 51.711.793,15, a revelar que não
foram observadas as diversas repreensões
e advertências antes efetivadas.
O
relatório técnico registrou a sonegação
ao exame do TCM de processos licitatórios,
correspondentes a despesas no expressivo montante de R$ 5.225.947,64,
além de repasse de recursos a 115 entidades civis sem fins
lucrativos, que totalizou o importe de R$ 197.587.343,76, sem
apresentação das devidas prestações de
contas ou mesmo esclarecimentos quanto aos que porventura digam
respeito a serviços prestados, ainda que tenha a Corte
ampliado o prazo deferido para defesa final, recebendo inúmeros
documentos após o seu término.
A
relatoria ressaltou também a violação ao
princípio da razoabilidade em gastos que totalizam o importe
de R$ 143.999.939,76 na contratação de empresa para
prestação dos serviços de transporte de pessoal,
pequenos volumes e cargas, transporte de pessoal com cobrança
de diárias –
1.470 veículos locados, com e sem motoristas –,
irregularidade esta que foi objeto de processo à parte.
O relator ainda destacou
como principais irregularidades contidas no parecer:
Déficit
financeiro no expressivo montante de R$ 172.698.846,09, patenteando
que os recursos disponíveis em Caixa e Bancos eram, em
31/12/2011, insuficientes para arcar com os compromissos assumidos,
mesmo os de curto prazo;
Percentual
insignificante de arrecadação dos valores inscritos em
dívida ativa, em torno de apenas 1% do montante;
Elevadas despesas no
pagamento de juros e multas por atraso do cumprimento de obrigações,
a revelar ausência de planejamento e, principalmente, de
controle nos gastos, referentes a contas da Embasa, INSS, Coelba e
Embratel, no montante de R$ 1.350.909,95;
Realização
de despesas irregulares, porquanto os respectivos contratos
encontravam-se com prazo de validade vencido, em elevado montante de
R$ 9.834.208,56, referente à locação de
imóveis, de máquinas e equipamentos e outros;
Ausência de
comprovação da regularidade documental de veículos
que aluga (DUT, IPVA, compatibilidade com o objetivo, etc.), no
montante de R$ 2.274.831,24;
Pagamento indevido de
multa por infrações de trânsito, no valor de R$
15.779,18, quando as mesmas são da responsabilidade dos
condutores dos respectivos veículos;
Descumprimento da Lei
Federal n.º 4320/64, concretizada em irregularidades nas fases
de empenho, liquidação e pagamento de diversos
processos, além de impropriedades na contabilização
e escrituração de receitas. A reincidência é
indício de que não se trata de meras falhas formais,
consideradas as advertências, ressalvas e orientações
anteriores do TCM;
Exagerados gastos com
consultorias, bem assim com comunicação e propaganda,
– essencialmente considerada a difícil situação
em que se encontra a Comuna –, totalizando, respectivamente,
R$ 2.718.786,64 e R$ 18.181.727,77;
Não apresentação
dos Pareceres dos Conselhos de Acompanhamento e Controle Social do
FUNDEB e do Municipal de Saúde, como legalmente imposto.
A Prefeitura gastou com
publicidade, em 2011, a quantia de R$ 13.147.684,09. Ditas despesas
têm oscilado, exercício a exercício, ora
crescendo, ora decrescendo, por fatores que não são
explicados nas contas respectivas.
O parecer destaca que o
Tribunal de Conta dos Municípios, antes de punir, orientou,
advertiu e ressalvou atos irregulares ou ilegais, como comprovam
pareceres anteriormente emitidos, que aprovaram contas, ainda que com
ressalvas, ou mesmo aplicando multas em valores pouco expressivos. A
reincidência, repetidamente constatada, é que tem
conduzido a Corte a rejeitar contas, na medida em que ela traduz
ineficiência, ineficácia e desleixo na administração
dos recursos públicos e no cumprimento da Lei. Assim, não
há que se falar em rigor do TCM ou na existência de boa
fé de parte do gestor. Resta comprovada, diz o parecer, a
desídia na adoção de providências
recomendadas e legalmente impostas, o que evitaria as consecutivas
rejeições.
Ademais, a atual gestão
do município de Salvador, aliada a uma série de
irregularidades na execução orçamentária,
adota procedimentos que tem deteriorado a sua situação
financeira, pois, desde 2009, apresenta disponibilidade de recursos
em Caixa/Banco insuficiente para pagar valores inscritos como
compromissos de curtíssimo prazo. Ao final do exercício
de 2009 o resultado era negativo de R$ 418.948.000,00, em 2010,
igualmente negativo de R$ 816.557.857,00 e, em 2011 continua
negativo, no montante de R$ 650.654.900,60.
Os déficits acima
apresentados demonstram colapso financeiro no Município e,
persistindo o resultado negativo no último ano de mandato,
remanescerá descumprida a disposição do artigo
42 da LRF, irremediavelmente comprometendo o mérito das
respectivas contas, como adverte o parecer prévio.
Cabe
recurso da decisão.
Íntegra do voto
do
relator das contas da Prefeitura de Salvador.