Tribunal aciona Ministério Público contra o prefeito de Salvador por descumprir os índices em Educação e Saúde, além de reincidência em diversas irregularidades.
Na sessão desta
quinta-feira (22/12), o Tribunal de Contas dos Municípios
rejeitou por unanimidade, com o placar de 7X0, as contas da
Prefeitura de Salvador, na gestão de João Henrique de
Barradas Carneiro, relativas ao exercício de 2010. O
presidente Paulo Maracajá Pereira embora não fosse
obrigado, fez questão de votar, acompanhando os outros seis
conselheiros.
O
relator do parecer, conselheiro Raimundo Moreira, solicitou o envio
de representação ao Ministério Público
Estadual contra o prefeito, imputou multa máxima no valor de
R$ 33.823,00 e determinou o ressarcimento aos cofres municipais do
expressivo montante de R$
549.480,30, relativo
a despesas com publicidade desacompanhadas de provas que
possibilitassem a análise do conteúdo da mensagem,
salvo se, no prazo de 30 dias da data desta decisão, o gestor
apresentar a este Tribunal os elementos sonegados.
Os valores da multa acima
indicada, bem como do ressarcimento imputado, se for o caso,
deverão ser
recolhidos com recursos próprios do responsável. Ainda
cabe recurso da decisão.
Da Administração
Orçamentária, Financeira e Patrimonial
A
relatoria comprovou a reincidência por parte da gestão
na falta de esforços no campo da Responsabilidade Fiscal, para
promover
o equilíbrio entre receitas e despesas públicas do ente
municipal, como mostra o agravamento do quadro nos últimos
exercícios financeiros, a saber: ocorrência de déficit
orçamentário; não atingimento das metas do
resultado primário estabelecido na LDO aprovada; saldo
financeiro insuficiente para os compromissos de curto prazo
(consignações e restos a pagar); baixa cobrança
da dívida ativa; elevação da dívida
consolidada líquida, e crescimento de gastos correntes,
notadamente na contratação temporária de pessoal
e terceirizados.
O
Município de Salvador apresentou uma receita arrecadada no
total de R$
3.006.497.420,56,
que correspondeu a 80,86%
da
previsão de receita, no montante de R$
3.718.193.000,00,
e realizou despesas na ordem de R$
3.251.306.798,52,
gerando um déficit orçamentário de R$
244.809.377,96.
A
Administração encerrou o exercício de 2010 com
saldo financeiro de R$
244.229.609,01, valor
inferior em 9,89%
ao
saldo final do ano anterior, que correspondeu a R$
268.382.849,33.
De
acordo com o Balanço Patrimonial de 2009, o saldo da Dívida
Ativa Tributária foi de R$
6.427.547.874,93.
Na execução orçamentária do exercício
de 2010, houve cobrança dessa receita no montante de R$
39.988.557,27,
que corresponde a apenas 0,62%
do
estoque inicial, menor inclusive que o esforço empreendido no
exercício anterior da ordem de 1,17%.
Com
a movimentação de inscrição de créditos,
baixas e atualização, a Dívida Ativa Tributária
encerrou o exercício com o elevado saldo de R$
8.591.530.222,25.
A
disponibilidade de caixa em 2010 alcançou R$
48.803.895,78,
que, deduzida de R$
370.311.008,59, valor
das Consignações e Valores de Terceiros, resultou no
montante negativo de R$
321.507.112,81.
No exercício, houve inscrição de Restos a Pagar
no montante de R$
495.050.244,15,
evidenciando que não houve saldo financeiro suficiente para
cobrir tais despesas, o que contribuiu para o desequilíbrio
fiscal do município.
Vale
ressaltar que o Passivo Financeiro totalizou R$
865.361.252,74 para
uma disponibilidade financeira de R$
48.803.895,78,
gerando um resultado negativo de R$
816.557.857,00, ficando alertado o gestor que tal situação
poderá
causar o descumprimento do art. 42, da Lei de Responsabilidade
Fiscal, repercutindo no mérito das contas no último ano
do mandato.
Destaca-se
que esta situação vem se deteriorando, pois ao final de
2009 o valor era negativo de R$
418.948.000,00 o
que demonstra que o montante praticamente dobrou em 2010.
Da Execução
Orçamentária
A 1ª Inspetoria
Regional de Controle Externo exerceu a fiscalização da
execução contábil, orçamentária,
financeira e patrimonial das contas da Prefeitura de Salvador,
apontando irregularidades, falhas e impropriedades, no exame da
documentação mensal, que motivaram a expedição
de notificações ao gestor.
O
relatório comprovou a reincidência
quanto ao descumprimento de preceitos estabelecidos na Lei 8.666/93
envolvendo irregularidades em processos licitatórios,
dispensas, e em contratos celebrados, bem como contratações
com preços irrazoáveis, com valores superiores aos
estimados e ausência de comprovação de prestação
do serviço pactuado.
Dentre os inúmeros
itens que ficaram sem justificativas estão:
a)
realização
de despesas cujo prazo contratual já se encontrava expirado.
Durante o exercício, o montante de pagamentos desprovido de
instrumento legal foi de R$
2.609.181,40;
b)
pagamentos,
no montante de R$ 1.857.974,28, efetuados
a prestadores de serviços médicos, sem o correspondente
desconto das contribuições ao INSS;
c)
reincidência no pagamento
de despesas com juros e multas em decorrência de atraso na
quitação de suas obrigações junto ao
INSS, à COELBA, à EMBRATEL, aos CORREIOS, à
EMBASA, à TELEMAR, à JOTAGE ENG. E INCORPORAÇÃO
LTDA, à VEGA ENGENHARIA AMBIENTAL S.A, à GRADO
ENGENHARIA LTDA, à TORRE EMPRE. RURAL E CONST.LTDA, à
BATTREBA. TRANSF.E TRATA.DE RESIDUOS S/A, à FOX DO BRASIL
SERV. DE LIMP. E CONS. LTDA, à ACMAV-ADM DE SERVIÇOS
LTDA e à SKY Blue Comércio e Serviço Ltda.,
demonstrando ineficiência do seu controle financeiro e causando
prejuízo aos cofres públicos de R$
2.122.928,67;
d)
manutenção
do contrato de prestação de serviços com a
empresa Protector Segurança Vigilância Ltda. em
detrimento à recomendação de membro do Douto
Ministério Público Estadual para que não
firmasse ou prorrogasse contratos com as empresas citadas na denúncia
oferecida pelo Ministério Público Federal. Além
disso, foi prorrogado o contrato firmado em 2004, o qual vigoraria
até o dia 30/07/2009, desdobrado, ao arrepio da lei
(extrapolou o limite de 60 meses fixado no art. 57 da Lei Federal
8.666/93), até 25/01/2010.
e)
ausência
de comprovação da prestação do serviço
acordado com
a Tsedakah – Soc. de Ensino Superior e Desenvolvimento Social
da Cidade de Dias D’Ávila, no valor de R$
256.000,00,
com o objetivo de desenvolver e praticar ações com
vista ao intercâmbio de experiências entre a concedente e
a Secretaria Municipal de Educação da Filadélfia
– EUA. A Inspetoria Regional não obteve evidência
da comprovação da prestação do serviço
acordado. Além disso, a entidade supramencionada não
apresentou o Alvará de funcionamento, documento elencado como
requisito necessário para firmação do acordo.
f)
contratação
de locação de veículos com preço
irrazoável de R$ 143.999.939,76, tendo
como vencedoras do pregão presencial nº 010/2010 da
SEPLAG as empresas Tradekar Transporte e Serviços Ltda. e LM
Transportes Serviços e Comércio Ltda. Foi questionada a
forma do pregão utilizado, que neste caso foi o presencial,
tendo a administração abdicada do pregão
eletrônico que em sua essência poderia ampliar o número
de interessados. Além disso, as empresas vencedoras não
apresentaram as exigências mínimas relativas às
máquinas, equipamentos e pessoal técnico especializado,
consideradas essenciais ao objeto da licitação,
mediante a apresentação de relação
explícita e da declaração formal da sua
disponibilidade. Por fim, a Administração Municipal
ignorou no processo licitatório o seu preço máximo
fixado de R$
136.118.244,72 para
a contratação dos serviços, superando o valor
estimado em R$
7.881.695,04.
g)
reincidência
na contratação de servidores sem concurso público,
utilizando, para tanto, da contratação de empresas de
terceirização de serviços, em infringência
ao disciplinado no inciso II, do art. 37, da Constituição
Federal, pelo que se recomenda ao gestor a realização
do obrigatório concurso público, com a possibilidade de
repercussão negativa em contas futuras.
Dos Limites
Constitucionais e Legais
Em
relação aos recursos aplicados na Saúde, o
pronunciamento técnico destacou que as aplicações
em ações e serviços públicos foram da
ordem de R$
223.447.464,14, o
que corresponde a 11,82%
dos
impostos e transferências, resultando no descumprimento do
disposto no inciso III, do art. 77, do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias, que obriga a aplicação
mínima de 15% das receitas pertinentes, cujo valor mínimo
seria de R$ 283.533.041,15.
Em sua defesa, o gestor
alegou, dentre outras coisas, que a contagem do índice
constitucional da saúde foi efetuada com base na portaria da
Secretaria do Tesouro Nacional, nº 462/2009. Com isso, a
apuração da receita, para cômputo do limite
constitucional, correspondeu a R$ 1.903.742.914,91, considerando as
receitas liquidas de imposto e transferências constitucionais
legais, ao passo que a execução das despesas alcançou
a cifra de R$ 306.198.428,31, sendo R$ 224.366.464,34, atinentes às
despesas pagas no exercício com fonte do tesouro e R$
81.831.963,97, relativos aos restos a pagar saldados em 2011.
Contudo,
o Tribunal de Contas dos Municípios, na forma do artigo 11,
da Resolução 1.277/08, desconsidera, para apuração
do valor aplicado em ações e serviços públicos
de saúde, as obrigações de despesa a serem pagas
no exercício seguinte se não houver saldo financeiro
correspondente, destacando que em 31/12/2010, as contas correntes
específicas, relativas ao Fundo Municipal de Saúde, não
apresentavam saldos, ao passo que os Restos a Pagar avaliados
atingiram o montante de R$ 81.831.963,97.
Em
Educação, a Prefeitura investiu na manutenção
e desenvolvimento do ensino R$
438.400.918,80 que
correspondem a 20,94%
de sua receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de
transferências, em desatendimento ao preceituado no art. 212,
da Constituição Federal, que exige a aplicação
mínima de 25%, que seria em 2010 um montante mínimo de
R$
524.892.233,00.
Novamente,
o gestor tentou se justificar apresentando outra forma de cálculo,
apurando, dessa vez, um índice de 25,81%. No entanto, na
composição do saldo total das despesas referidas (R$
541.807.991,66) apontadas pela Prefeitura, foram somados
indevidamente
R$
143.364.986,43 referentes ao total de restos a pagar das fontes
tesouro e FUNDEB, haja vista que não foram apresentadas as
disponibilidades existentes em 31/12/2010 que fizessem face às
obrigações contraídas e inscritas em restos a
pagar.
A
despesa total com o pessoal do Poder Executivo Municipal de Salvador
totalizou R$
1.238.448.153,36,
que corresponde a 45,36%
da
Receita Corrente Líquida de R$
2.730.179.517,93,
não ultrapassando, consequentemente, o limite definido pelo
art. 20, da Lei Complementar n° 101/00.
Quanto
à despesa com terceirizados, cotejando os exercícios de
2009 com 2010, a ampliação da despesa atingiu 8,76%.
Confrontando,
2008 com 2010, a aumento chegou a 16,23%.
No
que diz respeito aos temporários, o avanço da despesa
alcançou 54,16%
entre 2009 e 2010. Já entre 2008 e 2010 o dispêndio
cresceu, excessivamente, atingindo 183,46%
numa
clara indicação de admissão de pessoal sem o
devido concurso público em violação ao artigo
37, inciso II, da Constituição Federal.
Das Multas e dos
Ressarcimentos
João Henrique
também deixou de adotar medidas efetivas, inclusive judiciais,
para o cumprimento das decisões do TCM quanto ao pagamento de
multas e ressarcimentos devidos ao erário municipal,
principalmente, não demonstrando o pagamento de qualquer multa
ou ressarcimento de sua própria responsabilidade, que
totalizam respectivamente, R$ 53.500,00 (10 Processos) e R$
214.991,77 (03 Processos).
Somente o ex-presidente
da Câmara de Salvador, Valdenor Cardoso, é responsável
pelo ressarcimento de R$ 6.974.518,00 (05 Processos) e por multas no
valor total de R$ 218.081,00 (15 Processos).
As multas impostas pelo
TCM aos gestores possuem eficácia de título
extrajudicial. Desta forma, a administração tem o dever
de cobrar e de arrecadar essa receita, que destinada aos cofres do
município, pois caso ocorra a prescrição do
crédito, sem a devida cobrança, o agente que deu causa
a extinção poderá ser responsabilizado.
Outras
Irregularidades
a) inobservância de
regras da Lei nº 4.320/64, haja vista o cometimento de
irregularidades nas fases da despesa (empenho, liquidação
e pagamento);
a)
cancelamento de dívidas passivas sem comprovação
do relatório descritivo da origem
dos saldos e das providencias para baixa dos valores, conforme
Decreto Municipal nº 21.388/10 e Resolução TCM nº
1.060/05;
b) reincidência
quanto à não inclusão, na LDO de 2010, das
normas relativas ao controle de custos e à avaliação
de resultados dos programas financiados com recursos dos orçamentos
(art. 4º, I, “e”, da Lei 101/00), pois o Parecer
Prévio nº 832/08 já havia registrado esta falha;
c) reincidência no
que diz respeito à ausência de providencias para que os
recursos relativos à educação e saúde
passem a transitar em contas únicas e específicas, nas
formas das resoluções pertinentes do TCM;
d) reincidência
quanto à ausência de providências para a
desvinculação da Controladoria Geral do Município
do âmbito da Secretaria da Fazenda, promovendo-se a sua
autonomia institucional. Os Pareceres Prévios nºs 788/09,
832/08 e 943/09 já recomendaram sucessivamente a segregação;
e) reincidência
quanto ao elevado comprometimento orçamentário com o
reconhecimento de despesas de exercícios anteriores DEA’s.
Íntegra do voto do
relator das contas da Prefeitura de Salvador.